SOLUÇÃO NEGOCIAL PRÉVIA AO PROTESTO OFERECE MELHORIAS PARA CREDORES E DEVEDORES

De acordo com o relatório Justiça em Números 2023, produzido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2022 foram registrados mais de 31,5 milhões de novos processos, representando um aumento de 10% em relação ao ano anterior e estabelecendo um recorde na série histórica dos últimos 14 anos. Em outubro de 2023, havia 84 milhões de processos em tramitação nos tribunais do país.

Além disso, o spread bancário — que é a diferença entre a taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras e o custo de captação dos recursos — é uma das questões mais complexas e controversas no Brasil. Ele é considerado um dos principais obstáculos à expansão do crédito e ao fortalecimento do sistema financeiro, além de ser um fator que limita o desenvolvimento da nação.

Para melhorar o ambiente jurídico e econômico do país, os Tabelionatos de Protesto têm oferecido uma gama de serviços que fortalecem as finanças, estimulam o mercado financeiro e auxiliam na redução do custo do crédito.

A medida mais recente e que tem potencial para alavancar a economia brasileira, é o Provimento nº 168/2024, que altera o Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça, instituído pelo Provimento nº 149/2023 para dispor sobre a proposta de solução negocial prévia ao Protesto e sobre a proposta de renegociação de dívida já protestada.

“Umas das principais causas do elevado custo do crédito no Brasil é a inadimplência, correspondendo a 30,1% do spread bancário. O Brasil recupera apenas 0,182 cents para cada dólar dado em garantia, sendo o prazo médio de recuperação de quatro anos. Assim, as inovações de solução negocial prévia ao Protesto e de medidas de incentivo à renegociação de dívidas protestadas poderão contribuir para a melhoria da recuperabilidade do crédito e, consequentemente, com a redução do seu custo”, afirma o diretor executivo de Assuntos Jurídicos da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Vicente de Chiara.

Desde a Lei 14.711/2023, chamada de Marco Legal das Garantias, que fortalece o sistema de garantias e proporciona a recuperação de crédito visando impulsionar a economia, os Cartórios de Protesto passaram a tratar da solução negocial prevista no capítulo V da Lei. No entanto, sem os parâmetros básicos definidos pela Corregedoria, os tabelionatos ainda não haviam começado a implementar a medida.

Antes mesmo do Marco Legal das Garantias, em 2018, o Provimento 72 publicado pela Corregedoria Nacional de Justiça já previa medidas de incentivo à quitação ou à renegociação de dívidas protestadas nos tabelionatos de Protesto do Brasil. Com o Provimento nº 168/2024, a solução negocial torna-se uma realidade, propiciando o bom entendimento dos players que atuam no mercado financeiro. Basicamente, o Provimento tornou o Protesto um instrumento menos “drástico”, sendo mais amigável em algumas situações.

Em 2019, a possibilidade da solução negocial prévia já havia sido ventilada também pela Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo (PGE-SP) que entende que a medida permitirá a regularização das dívidas antes que sua divulgação traga restrições financeiras ao contribuinte.

“A utilização de meios alternativos à cobrança judicial das Certidões de Dívida Ativa é importante instrumento de cobrança administrativa e desjudicialização, trazendo maior celeridade e eficiência à cobrança do crédito tributário, que, ao final, reverterá no atendimento de políticas públicas para a sociedade. A parceria entre a Procuradoria Geral do Estado e o Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil - Seção São Paulo (IEPTB/SP) para o Protesto de Certidões de Dívida Ativa vem de longa data e gera resultados importantes para o Estado de São Paulo”, salienta a procuradora da Subprocuradoria Geral do Estado de São Paulo, da Área do Contencioso Tributário-Fiscal, Danielle Eugenne Migoto Ferrari Fratini.

Para o presidente do IEPTB/BR, André Gomes Netto, cujo trabalho à frente da instituição propiciou o desenvolvimento da norma, o Provimento nº 168 da Corregedoria Nacional de Justiça tem uma importância estratégica no cenário jurídico e econômico brasileiro, principalmente no que diz respeito à gestão de dívidas e à proteção dos direitos tanto dos credores quanto dos devedores, além das garantias.

“Esse Provimento foi criado com o objetivo de instituir uma solução negocial prévia ao Protesto de títulos e de promover a renegociação de dívidas já protestadas, atuando como um mecanismo preventivo que busca evitar a judicialização excessiva e os impactos negativos do Protesto na vida dos devedores”, pondera Netto.

“O Provimento reconhece que o Protesto de títulos, embora seja um direito do credor, pode ter consequências graves para o devedor, como a restrição ao crédito e o comprometimento da reputação financeira. Portanto, a norma enfatiza a importância de se buscar uma solução amigável e consensual antes de recorrer ao Protesto, promovendo a regularização da dívida de forma menos onerosa e mais eficiente”, complementa o presidente do IEPTB/BR.

CENPROT

Segundo o artigo 383 do Provimento, a Central Nacional de Serviços Eletrônicos dos Tabeliães de Protesto de Títulos (Cenprot), “deverá ser a plataforma eletrônica designada para a intermediação, negociação e formalização de acordos entre credores e devedores, bem como para a integração com os tabelionatos de Protesto territorialmente competentes, via API (Interface de Programação de Aplicações) disponibilizada pela plataforma, assegurando a autenticidade, integridade e legalidade dos atos praticados”.

Além disso, o artigo 379 diz que “os tabeliães de Protesto manterão serviços e ferramentas que garantam a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso à Cenprot, para a consulta dos registros de adimplemento ou inadimplemento de títulos ou documentos de dívida, sem valor jurídico de uma certidão, visando assegurar a acessibilidade a produtos e serviços que incentivem a solução negocial de dívidas e a obtenção de crédito”.

De acordo com Renato Dolci, CEO da Ineo, empresa responsável por gerir a plataforma “Resolve” - uma solução tecnológica que se propõe a comunicar eletronicamente os cidadãos e empresas que têm Protesto em aberto – a Cenprot é essencial porque permite a execução dos serviços relacionados ao Protesto de títulos de maneira integrada e eficiente, independentemente da localidade.

“A centralização desses serviços em uma plataforma única facilita a coordenação entre diferentes tabelionatos e garante que os procedimentos sejam conduzidos de forma padronizada e transparente. Além disso, a central nacional possibilita uma comunicação mais eficaz entre credores, devedores e tabeliães, facilitando o envio e o recebimento de propostas de solução negocial e de renegociação de dívidas. Isso não só agiliza o processo, como também garante que todas as partes envolvidas tenham acesso às mesmas informações e possam tomar decisões informadas”, explica Dolci.

Mestre e doutor em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo (USP) e tabelião de Protesto de Letras e Títulos de Campinas – SP, Reinaldo Velloso dos Santos diz que o grande instrumento para efetivar as medidas do Provimento é feito por meio da central eletrônica.

“O cidadão não vai precisar se deslocar até o Cartório, podendo fazer uma interação, avaliar as propostas que foram disponibilizadas pelo credor e fazer contra-propostas por meio eletrônico. É muito conveniente para o usuário essa possibilidade e principalmente para os apresentantes dos títulos, que vão poder simplesmente definir os parâmetros dessas medidas de incentivo, de solução negocial prévia no próprio sistema e essa interação vai ocorrer de forma eletrônica. Não precisa montar uma estrutura de atendimento para os devedores que vierem procurar. O devedor vai ser encaminhado para a central eletrônica. Ou seja, vai agilizar bastante esses procedimentos e tudo vai ser feito diretamente na plataforma eletrônica”, garante o tabelião.

Tabelião de Protesto de Santo André, na grande São Paulo, Mario Camargo enfatiza que a comunicação com o usuário poderá ser diretamente no tabelionato, mas a ferramenta de negociação será online, em meio eletrônico da Central Nacional de Protesto.

“É importantíssimo que seja dessa maneira para haver uma uniformização nos procedimentos no Brasil inteiro e uma facilitação para que o cidadão não precise se deslocar até determinado Cartório e possa fazer a negociação diretamente na central. E também para que nós possamos prestar esse serviço em todas as localidades, independentemente de o Cartório ter estrutura ou não para a prestação desse serviço”, explica Camargo.

“Além de obrigatória, ela [central] é fundamental para uma boa prestação do serviço de solução negocial prévia ao Protesto. Acredito que essa solução negocial prévia vai trazer o Protesto para o momento anterior nas réguas de cobrança dos credores. A pessoa que via o Protesto como algo mais agressivo, vê agora com a possibilidade de solução negocial prévia de até 30 dias no tabelionato, como um meio amigável de se comunicar com o seu devedor”, complementa o tabelião.

SUSTENTABILIDADE

O Provimento fala também na Meta nº 16 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), cujo objetivo é promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, além de proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.

“Ao adotar medidas de solução negocial prévias e posteriores ao Protesto, o Provimento nº 168 da Corregedoria Nacional de Justiça proporciona a resolução de conflitos fora do sistema judiciário de forma mais acessível e eficiente, reduzindo os custos da cobrança ao credor e ao devedor. Garante, ainda, que todos os cidadãos tenham acesso a mecanismos eficientes para regularizar sua situação financeira e reduzir a inadimplência, contribuindo para sua saúde financeira”, diz a procuradora do Estado de São Paulo, Danielle Fratini.

Ao estimular soluções negociais antes do Protesto e facilitar a renegociação de dívidas, a norma contribui para prevenir a exclusão financeira e social de indivíduos e empresas que, de outro modo, enfrentariam grandes dificuldades para se reintegrar ao mercado de crédito.

“Ao padronizar os procedimentos e promover a transparência nos processos de Protesto, o Provimento também contribui para a construção de instituições mais eficazes e responsáveis, alinhando-se aos princípios de governança estabelecidos pelos ODS. Dessa forma, o Provimento nº 168 não só regula questões específicas do Protesto de títulos, mas também apoia um desenvolvimento mais amplo e sustentável do sistema de justiça no Brasil”, ressalta o CEO da Ineo, Renato Dolci.

Gerente de serviços institucionais da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Renan Luiz Silva acredita que o “Provimento é uma medida adicional as tentativas de recuperação de crédito e reinserção das pessoas seja jurídica ou física na economia ativa”.

Segundo ele, a promulgação da Meta nº 16 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) pode auxiliar na aplicação do Provimento desde que “os custos e o acesso sejam realizados de forma equivalente entre as partes.”

Para Reinaldo Velloso, “o tabelião de Protesto age na tutela de interesses, não apenas privados, mas de interesses públicos”.

“O Provimento evita a judicialização, com uma medida que pode ser muito bem-sucedida, anterior ao agilizamento de uma ação ou mesmo se estiver em curso. Acho que realmente coloca a instituição do Protesto de uma forma muito alinhada com os objetivos de desenvolvimento sustentável da agenda 2030”, pontua o tabelião.

CIDADANIA FINANCEIRA

Ao promover a sustentabilidade com o Provimento nº 168, os Cartórios de Protesto também destacam a importância de ampliar o acesso a serviços financeiros, assegurando a cidadania financeira da população.

Segundo o artigo 378 do Provimento, “os tabeliães de protesto, por intermédio do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil, deverão desenvolver ferramentas e sistemas que promovam campanhas educativas, meios e alternativas voltados à redução dos índices de inadimplência e à regularização extrajudicial de dívidas e restrições cadastrais”.

O presidente do Instituto de Estudos de Protesto do Rio Grande do Sul (IEPRO), Romário Mezzari, conta que no estado gaúcho, assim como em outras unidades da Federação, há inúmeras campanhas educativas de cidadania financeira que fortalecem o instrumento de Protesto diante da sociedade.

“Projetos de divulgação já existem dentro dos Institutos Estaduais de Protesto para disseminar as informações e mostrar novas possibilidades de negociação e renegociação de dívidas. Além de mídias em rádio e extenso trabalho de divulgação nas redes sociais, acessível a todos, é realizada anualmente uma pesquisa econômica, amplamente divulgada pelos meios de comunicação, para revelar o comportamento financeiro da população gaúcha, a fim de orientar melhores e mais saudáveis práticas econômicas, para reduzir o inadimplemento”, comenta Mezzari.

O presidente do IEPTB/BR, André Gomes Netto, esclarece que o Provimento pode contribuir para o desenvolvimento de programas que promovam boas práticas de crédito tanto para credores quanto para devedores, criando um ambiente financeiro mais equilibrado e com menor risco de inadimplência. Isso pode envolver, por exemplo, a implementação de sistemas de monitoramento de crédito que alertem os usuários sobre potenciais riscos de inadimplência e ofereçam soluções preventivas.

“O IEPTB/BR tem desenvolvido plataformas tecnológicas que facilitem a renegociação de dívidas de forma extrajudicial, oferecendo ao devedor opções claras e acessíveis para regularizar sua situação financeira antes que o Protesto ocorra, como é o caso da plataforma Resolve. Essas plataformas podem incluir sistemas de notificação automática, cálculo de propostas de pagamento personalizadas e interfaces amigáveis que permitam ao devedor negociar diretamente com o credor através de meios digitais”, salienta Netto.

A Associação dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), também vê com bons olhos o Provimento nº 168 no que tange a solução das dívidas, segundo o diretor da entidade, Roberto Vertamatti.

De acordo com ele, “em função dos juros praticados na economia, nossas dívidas acabam dificultando ainda mais a quitação das mesmas. Portanto, esta alternativa oferecida pelo provimento nº 168, acaba contribuindo para um processo de melhor solução das dívidas”.

 “Sem dúvida nenhuma que a promoção da cidadania inclui a inclusão financeira. Portanto, tudo o que os tabeliões de protesto puderem desenvolver em relação a ferramentas e campanhas educativas irão ao encontro deste Provimento”, reafirma o diretor da Anefac.

Fonte: Revista Cartórios com Você


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